Publicado em 05/08/2019
“O desaparecimento político, como o que aconteceu com meu irmão, foi uma das coisas mais terríveis que a ditadura inventou. Meu irmão foi preso e todos diziam que não tinha sido. Eu tinha certeza absoluta de que tinha sido preso com um companheiro, estão os dois desaparecidos até hoje. Não sabemos onde e em que circunstâncias ele foi morto e seu corpo ocultado”. Este relato extremamente sensível e emocionado é da assistente social Rosalina Santa Cruz, em trecho do livro Serviço Social, Memórias e Resistências contra a Ditadura, publicado em 2017 pelo CFESS.
Ela se referia a Fernando Santa Cruz, integrante do grupo Ação Popular (AP), organização contrária ao regime militar, preso e morto pelo Estado brasileiro em 1974, cujo nome tomou os noticiários da semana passada (29/7), após uma declaração cruel e sarcástica do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PSL), a Felipe Santa Cruz, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e filho de Fernando.
Na ocasião, Bolsonaro disse que poderia contar como Fernando Santa Cruz havia desaparecido nos tempos de repressão.
A OAB divulgou uma nota de repúdio, na qual afirmou haver “crueldade e falta de empatia” nas declarações do presidente, e Felipe Santa Cruz ajuizou petição no Supremo Tribunal Federal (STF) para Bolsonaro se explicar, tendo em vista que, após a primeira declaração, Bolsonaro tentou minimizar a polêmica afirmando que a versão que ele conhecia era a de que Fernando havia sido morto por militantes da esquerda. Tal fala contraria a versão comprovada pela Comissão Nacional da Verdade de que Santa Cruz foi perseguido, morto e teve o cadáver ocultado pelo Estado brasileiro.
“Para o Conjunto CFESS-CRESS, as declarações do presidente demonstram menosprezo à vida e aos direitos humanos e são uma tentativa de apagar a história do país que, comprovadamente, prendeu, torturou e matou pessoas que ousaram questionar a Ditadura Civil-Militar. Assim, nos solidarizamos à família de Fernando Santa Cruz, em especial à nossa companheira e colega de profissão, Rosalina Santa Cruz, que também lutou contra o regime militar, que teve forças para suportar e enfrentar a violência, a dor e o silêncio; que, assim como seu irmão, foi à luta em defesa de outro tipo de sociabilidade”, afirmou a presidente do CFESS, Josiane Soares.
Diversos outros sujeitos no Serviço Social brasileiro também manifestaram solidariedade à Rosalina e a sua família e repúdio à declaração de Bolsonaro.
Professores/as do Curso de Graduação e do Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço Social da PUC-SP, aonde Rosalina é docente, divulgaram nota na sexta (2/8) em que afirmam: “Manifestamos nossa solidariedade à companheira Rosalina Santa Cruz, professora do Curso de Serviço Social da PUC-SP, assistente social e militante de direitos humanos, extensiva à sua família, tendo em vista o ataque à memória do seu irmão Fernando Santa Cruz e dos que foram mortos e torturados pela ditadura civil-militar de 1964”.
A nota ainda destaca que “indignação é a palavra que define o sentimento de todos frente à essa tentativa de desmentir dados oficiais sobre o desparecimento e a morte de Fernando Santa Cruz nos porões da ditadura, de banalizar a tortura e os crimes cometidos, evidenciando um profundo desrespeito ao sofrimento dos familiares e à memória dos mortos e desaparecidos”.
E enfatiza: “Embora demonstre um nível de desumanidade e de crueldade assustador, esta manifestação não é estranha a quem defende sistematicamente a violência, o ódio e cultua a imagem do mais bárbaro torturador da ditadura. Porém, tal postura é incompatível com a função de chefe de Estado, em um regime democrático que exige o respeito à Constituição, a defesa dos direitos humanos, como a não discriminação por divergências políticas, entre outras”.
Para a presidente do CFESS, Josiane Soares, em tempos de negação da política e banalização do autoritarismo, é preciso sempre se contrapor a discursos e falas violadoras dos direitos humanos. “Ditadura não se celebra ou se comemora! As histórias desse período de horror devem ser resgatadas para que não se repitam”, finalizou Josiane.
Sobre Fernando Santa Cruz
Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira (Recife, 20 de fevereiro de 1948 – Rio de Janeiro, desaparecido em 22 de fevereiro de 1974) foi um estudante e militante do movimento estudantil brasileiro, símbolo da resistência contra a ditadura militar.
No fim dos anos 1960, se juntou à Ação Popular (Marxista-Leninista). Desapareceu em fevereiro de 1974, após ser preso por agentes do DOI-Codi, órgão de repressão da ditadura militar, no Rio de Janeiro. Ele era pai do atual presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, na época um bebê de dois anos.
Nenhum documento escrito sobre ele pela própria ditadura o vincula a qualquer ato violento ou da esquerda armada. Fernando não era processado quando desapareceu, aos 26 anos. Ele usava seu nome e sobrenome reais e era funcionário público de uma empresa de água e energia de São Paulo.
Saiba mais sobre o projeto Serviço Social, Memórias e Resistências contra a Ditadura
Assista ao depoimento de Rosalina:
Fonte: CFESS
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