Publicado em 06/03/2020
Feministas em marcha durante atos pelo Dia Internacional das Mulheres em, BH, no ano passado. Foto: Marcela Viana.
Sempre que um grupo social avança em termos de ganhos de direitos, a estrutura social é tensionada, altera-se o status quo de uma pequena elite econômica, provocando conflitos reacionários. A luta feminista pela emancipação das mulheres tem ganhado visibilidade nos últimos anos e alcançado conquistas relevantes, como é o caso da Lei Maria da Penha, de 2006, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica.
Como resposta aos avanços libertários, fica cada vez mais evidente o crescimento de forças conservadoras que, com discursos moralistas e religiosos, transferem para as mulheres, a responsabilidade coletiva, do Estado, em nutrir e cuidar da vida humana. No Brasil, a ascensão ao poder de um presidente declaradamente conservador, legitima este posicionamento de cunho neoliberal e que visa o lucro acima de tudo.
“Se até então os homens guardavam para si, no privado, uma série de angústias e reclamações diante dos avanços que o feminismo tem proporcionado, quando um líder consegue aglutinar esses incômodos, isso ganha corpo de um projeto, invadindo o Estado para se transformar em um projeto de nação”, pontua Esther Maria Guimarães, economista, mestranda em Ciência Política e militante do Levante Popular da Juventude.
Neste processo de implementação de políticas neoliberais que incidem diretamente sobre a vida das mulheres, a militante explica que é essencial que figuras femininas legitimem as ações antifeministas dentro do governo, como vem acontecendo no atual mandato.
“O termo ‘token’ é usado nos estudos sobre pautas identitária para se referir a pessoas que servem para validar práticas e políticas de grupos conservadores. Da mesma forma que temos o hábito de dizer que ‘não sou racista, porque tenho amigos negros’ ou ‘não sou homofóbico, porque meu cabeleireiro é gay’, na política também existe uma espécie de representação dessa figura que serve para implementar ideias de um determinado projeto”, aponta.
Em uma conjuntura como esta, é preciso reforçar a diferença entre movimento feminista e movimento de mulheres, como elucida Esther: “O primeiro diz respeito a mulheres que se identificam em torno de algum tipo de opressão e se unem para combatê-la, já no outro caso, a organização feminina tem como foco a defesa de uma pauta antifeminista, como acontece atualmente, no governo. Faz mais sentido que sejam mulheres a assumir este papel do que homens”.
De volta para a casa
"Bela, recatada e do lar" é discurso para transferir responsabilidades do Estado às mulheres, diz Esther Maria. Foto: Marcela Viana.
A defesa de que lugar da mulher é dentro de casa, cuidando dos afazeres domésticos e da educação de suas filhas e filhos, tem retomado com força total. No contexto brasileiro, ela já é falha em sua essência, se considerarmos que a família brasileira é, em sua maioria, composta por uma mãe solo que precisa sair do espaço doméstico para trabalhar e se sustentar. Mas, o discurso tem servido para colocar nas costas das mulheres, funções do poder público.
Relacionada à ideia de família como valor máximo de uma sociedade, a frase “bela, recatada e do lar” traz consigo a ideia de privatizar questões que devem ser de competência do Estado. A luta pela saúde pública é um bom exemplo do entendimento de que a manutenção da vida precisa ser de responsabilidade coletiva, mas, quando crescem, no governo, interesses privados e o avanço neoliberal, estes valores se perdem e as mulheres passam a ser responsabilizadas por cumprir este papel, indica Esther.
“Se antes havia um esforço para que nossa política se voltasse para o cuidado com a vida, agora ela se volta para o lucro, para a acumulação e o interesse privado. Mas, alguém precisa continuar dando sustentação para a vida humana, que precisa ser nutrida, e a mulher acaba sendo esta figura. É disso que surgem as duplas, triplas jornadas de trabalho feminino, quando, além do seu trabalho remunerado – ou não -, elas precisam dar conta do cuidado de todas e todos integrantes da família.”
Para a militante feminista, as políticas conservadoras de controle dos corpos das mulheres, de fortalecimento do poder masculino no ambiente doméstico vêm para controlar as mulheres e determinar aquilo que deve ou não ser levado para a política. O cuidado com a vida já não é mais um deles. Este cenário favorece medidas governamentais que visam acabar com ensino público, as creches públicas, o Sistema Único de Saúde (SUS), a Seguridade Social, entre outras políticas sociais.
Resistência no cotidiano
A luta cotidiana também deve se refletir na hora das eleições: opte por quem defende os direitos das mulheres. Foto: Marcela Viana.
Momentos de crise, como o que vivemos atualmente no Brasil, são sentidas no cotidiano das mulheres. O desmonte da Seguridade Social, por exemplo, vai impedir que pessoas idosas tenham uma previdência social digna, restando às mulheres, essencialmente, o cuidado dessa população. Em ano de eleições municipais, Esther reforça a importância do voto consciente e da organização feminina em defesa dos direitos sociais.
“É importante não perder de vista que as lutas são coletivas. A maior proteção contra a violência doméstica e o silenciamento é estar junta com outras mulheres, em coletivos feministas, espaços de estudo, associações de bairros etc. Não podemos esperar que o Estado supra a demanda de proteção dos nossos corpos, saúde, integridade emocional, ou mesmo esperar uma solidariedade gratuita por parte dos homens que estão a nosso redor”, avalia.
Além disso, a militante destaca que nas eleições, não basta votar em mulher para que este seja um voto consciente. “Estas mulheres têm que trazer consigo pautas, uma agenda de emancipação coletiva. As vivências de opressão das mulheres não são casos isolados, erros do sistema ou uma espécie de desvio moral apenas. As situações de violência contra a mulher fazem parte de uma estrutura de reprodução do poder e é preciso que as candidatas que elejamos tenham essa consciência”, considera.
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