Publicado em 19/01/2023
Veja, a seguir, matéria do Jornal O Tempo, publicada neste 18 de janeiro, com o título “Deputado mineiro quer desregulamentar leis de 83 profissões”.
Entre as atividades que podem ser afetadas pelo projeto estão as profissões de psicólogo, veterinário e fisioterapeuta
Há poucos dias do fim de seu mandato, o deputado federal mineiro Tiago Mitraud (Novo) protocolou na Câmara dos Deputados um projeto de lei que propõe revogar 86 decretos e leis que regulamentam diversas profissões. Sob o argumento de que as atividades incluídas na proposta “não oferecem risco à segurança, à saúde e à ordem pública”, o parlamentar pede que profissões como fisioterapia, psicologia e medicina veterinária não exijam mais obrigatoriedade de diploma.
Na proposta, Mitraud defende também a extinção de alguns conselhos regionais que regulamentam as atividades de engenharia, odontologia, química e contabilidade. O deputado pede ainda que o Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), necessário para o exercício da advocacia no país, seja descontinuado.
“Sob a justificativa de proteger trabalhadores e consumidores, essas regras acabam, na verdade, gerando exclusão. Engessam o mercado de trabalho, criam reservas de mercado e jogam para a ilegalidade milhões de brasileiros que apenas querem trabalhar. Apenas com mais liberdade profissional teremos mais pessoas com acesso ao mercado de trabalho formal, conquistando sua independência e oferecendo serviços de qualidade a um menor custo para o consumidor”, argumentou o parlamentar em suas redes sociais.
Na justificativa do projeto, Mitraud argumenta também que “ao impor inúmeras barreiras de entrada, o exercício profissional fica limitado a condições que, muitas vezes, não refletem critérios que, de fato, tornam a prática mais segura”. O parlamentar critica também a atuação de entidades que regulamentam profissões, como é o caso dos Conselhos Regionais.
Na avaliação do deputado, uma enorme massa de profissionais qualificados são proibidos de trabalhar “por não atenderem aos critérios formais, que na grande maioria das vezes, não possuem correlação com a qualidade do serviço prestado”.
“Isso gera um aumento de custo na economia e também uma barreira à entrada de novos prestadores de serviço, o que diminui a competição e aumenta os preços praticados”, pontuou Mitraud no texto do projeto, que pode continuar tramitando no Congresso mesmo com a ausência do parlamentar na casa na próxima legislatura. O deputado não disputou a reeleição em 2022 e acabou não sendo eleito na chapa em que concorreu a vice à Presidência da República ao lado do cientista político Felipe D’Avila (Novo).
Ainda sem um relator, as chances para que o projeto seja colocado em pauta são pequenas. O motivo é a falta de força da bancada do Novo, que elegeu apenas três deputados federais. Outro argumento apontado por entidades e críticos ao projeto são as “falhas” na elaboração da proposta.
Uma das maiores críticas do deputado ao protocolar a medida foi em relação a exigência de um registro profissional em conselhos regionais para o desempenho de determinadas profissões. Porém, como o texto do projeto pede a anulação da integralidade de 75 leis que regulamentam as atividades, há casos de profissões, que até mesmo o diploma de formação não seria exigido mais, como é o caso de economistas e biólogos, por exemplo.
Falta de fiscalização
Para o advogado trabalhista Antônio Queiroz, com a não regulamentação das profissões, diversos profissionais deixaram de ser fiscalizados. Segundo o especialista, se a intenção do deputado fosse questionar a atuação dos conselhos regionais, seria mais efetivo ele propor um projeto que fomentasse especificamente a discussão sobre a atuação das entidades.
“É uma aberração sem tamanho. Além de impactar o mercado educacional e a formação profissional de gerações futuras, porque é o diploma que certifica a qualificação profissional e a experiência, com a extinção de conselhos quem vai fiscalizar o exercício dos profissionais? Os conselhos são os responsáveis por ter essa estrutura de fiscalização e até punir maus profissionais”, explicou o especialista que ainda acrescentou. “No mundo inteiro existe conselho profissional, com estruturas e regras diferentes, mas existem. O que poderia se pensar é em uma nova forma de fomento, assim como se fez com os sindicatos. A extinção é um absurdo”, avaliou Queiroz.
A reportagem de O Tempo procurou o deputado Tiago Mitraud para comentar a proposta e as críticas que têm sido feitas ao projeto, mas não obteve retorno
Entidades repudiam projeto e pedem arquivamento da proposta
Nas redes sociais, entidades e profissionais das áreas afetadas pelo projeto de lei pedem que a medida seja retirada da pauta. Diversos usuários criaram, inclusive, uma petição online contra a proposta. O documento conta com a assinatura de 31.593 pessoas.
Em uma enquete realizada no site da Câmara, 98% dos participantes também discordaram da proposição, enquanto apenas 2% concordaram com a medida.
Para o conselheiro do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG), Danty Marchezane, a iniciativa do parlamentar mineiro prejudica, principalmente, os consumidores.
“Desregulamentar profissões é um retrocesso, uma barbárie contra a sociedade. Imagina o cidadão não ter mais um lugar onde ele possa denunciar a conduta de determinado profissional que, às vezes, não foi correto e ético? Quem faz isso são os conselhos, que fiscalizam os profissionais Conselhos são órgãos de Estado. Você está criando um clima de desconfiança e insegurança”, pontuou o psicólogo.
O conselheiro do Conselho Regional de Serviço Social de Minas Gerais (CRSS-MG), Leonardo Koury, concorda. Para ele, desregulamentar profissões é o mesmo que “desvalorizar a ciência”. No projeto de lei do deputado Tiago Mitraud, a profissão de assistente social é uma das atividades que passam a não exigir mais diploma.
“Hoje temos 33 milhões de pessoas em situação de fome. Assistentes Sociais atuam a partir de uma leitura científica da realidade social. Como garantir direitos sociais sem qualquer possibilidade de formação? Gostaríamos de que toda energia do parlamento estivesse focada nas agendas que propiciam um país melhor e mais justo para todas as pessoas”, analisou Koury.
Segundo ele, a entidade junto com outros conselhos e organizações têm se mobilizado para dialogar com parlamentares sobre os riscos da aprovação do projeto.
“É surreal uma medida que desarticula a conexão entre trabalho e formação profissional. É a partir do conhecimento científico que os profissionais compreendem o papel ético e técnico do seu trabalho “, completou o conselheiro.
O Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Crefito-MG) também se posicionou contra o projeto. Na avaliação do presidente da entidade, Anderson Coelho, a proposta tem poucas chances de seguir tramitando no Congresso. “A Comissão de Assuntos Parlamentares já está criando mecanismos para demonstrar ao parlamento a importância de que essas profissões continuem sendo protegidas”, afirmou Anderson em suas redes sociais.
Em nota, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado (CREA-MG) avaliou o projeto como “oportunista” e ressaltou que em parceria com Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) também tem trabalhado para impedir que “ iniciativas como esta coloquem a sociedade em risco”. Ainda segundo a entidade, dificilmente a medida irá encontrar respaldo jurídico na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, por sua vez, argumenta que a regulamentação da profissão é fundamental para que não haja riscos à segurança e saúde dos cidadãos, além de patrimoniais. A entidade também diz atuar permanente no Congresso Nacional “para o monitoramento de proposições que digam respeito à categoria, agindo prontamente para neutralizar aquelas que interfiram na atuação profissional, em prejuízo da proteção da sociedade”.
A reportagem de O TEMPO entrou em contato com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para comentar a medida e o pedido de extinção do exame da OAB e aguarda um posicionamento.
Veja algumas profissões e conselhos que podem ser atingidos pela proposta:
Leiloeiro
Aeronauta
Conselhos Regionais de Engenharia e Arquitetura
Atuário
Conselho Regional de Contabilidade
Fisioterapeuta
Terapeuta ocupacional
Jornalista
Economista
Conselho Federal de Química
Vendedores
Ordem dos Músico
Massagista
Leiloeiro Rural
Geólogo
Bibliotecário
Psicólogo
Corretor de seguros
Diretor de teatro
Cenógrafo
Professor de Arte Dramática
Ator
Contra-regra
Cenotécnico
Sonoplasta
Engenheiro florestal
Publicitário
Estatístico
Técnico de Administração
Representantes comerciais autônomos
Engenheiro-Agrônomo
Profissional de Relações Públicas
Médico Veterinário
Técnico Industrial
Orientador educacional
Propagandista e Vendedor de Produtos Farmacêuticos
Guardador e lavador autônomo de veículos automotores
Corretor de imóveis
Artista
Técnico em Espetáculo de Diversões
Arquivista e Técnico de Arquivo
Radialista
Geógrafo
Técnico em Prótese Dentária
Meteorologista
Sociólogo
Fonoaudiólogo
Museólogo
Secretário Executivo
Economista Doméstico
Técnico em Radiologia
Especialização de engenheiros e Arquitetos em Engenharia de segurança do trabalho
Profissão de técnico de Segurança do trabalho
Assistente Social
Conselho regional de Economistas Domésticos
Nutricionista
Registro para Guia de Turismo
Treinador de Futebol
Profissional de Educação Física
Peão de Rodeio
Enólogo e técnico em Enologia
Garimpeiro
Oceanógrafo
Conselho Federal e Regional de Odontologia
Bombeiro Civil
Pescador profissional e aquicultor
Mototaxista
Motoboy
Repentista
Instrutor de trânsito
Tradutor e intérprete da língua Brasileiras de Sinais
Sommelier
Taxistas
Turismólogo
Cabeleireiro
Barbeiro
Esteticista e Cosmetólogo
Manicure
Pedicure
Depilador
Maquiador
Motorista Profissional
Comerciário
Árbitro de futebol
Vaqueiro
Artesão
Detetive particular
Piloto de aeronave, comissário de voo e mecânico de voo
Técnico em Biblioteconomia
Arqueólogo
Físico
Corretor de moda
Psicomotricista
Biólogo
Desobriga que seja um vigilante o contratado para os serviços de vigilância e de transporte de valores
Desobriga aprovação no exame da ordem para ser Advogado
Fonte: Jornal O Tempo.
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