Ética e sigilo profissional na questão do Depoimento Sem Dano

Publicado em 14/01/2015

Desde a suspensão, em 2013, da Resolução do CFESS que determina como não atribuição ou competência de assistentes sociais a aplicação do Depoimento Sem Dano (DSD), o tema tem ganhado mais visibilidade dentro e fora da categoria e envolve posicionamentos polêmicos sobre a ética profissional.

No mês passado, a 8ª Semana de Direitos Humanos de Minas Gerais, promovida em BH, pelo governo estadual, teve em sua programação a oficina “Perspectivas e desafios do Depoimento sem Dano”. A atividade teve a presença da assistente social da Vara Cível da Infância e Juventude de Belo Horizonte (TJMG), Márcia Jacinto, que falou ao CRESS-MG sobre como anda essa discussão em Minas Gerais.

O Depoimento Especial ou Depoimento Sem Dano se trata da inquirição de crianças e adolescentes em processos judiciais sobre abuso sexual e é atualmente feita por psicólogos e assistentes sociais. A metodologia fere os direitos da vítima, uma vez que não leva em consideração sua idade, desenvolvimento emocional e o próprio trauma que lhe foi causado quando do abuso sofrido.

A violação dos direitos humanos da vítima também se dá a partir da prerrogativa de que ela “deve depor que foi abusada e acusar seu algoz”, como comenta Márcia.

“Ora, e se ela não tiver sido abusada? Se for um caso de falsa denúncia e a criança estiver sendo manipulada a falar algo que não vivenciou, como em situações de alienação parental? Nesses casos, o suposto réu ou abusador, poderá ser julgado indevidamente, violando o seu direito e também o da criança que é posta como aquela que vai indicar o réu, um papel que cabe à Justiça”, afirma.

Sigilo profissional

Não são todas as profissões que devem a obrigação do sigilo e, para Márcia, isso já seria revelador da disposição social que é atribuída a algumas profissões de terem o dever e o direito de mantê-lo. É consenso que o profissional conheça todos os elementos necessários para o bom cumprimento de seu trabalho, desde as condições institucionais até as informações obtidas na sua relação com o usuário.

O sigilo profissional não é absoluto, no caso do Serviço Social, esse elemento abre a possibilidade de o assistente social avaliar, subjetivamente, se deve manter ou divulgar o fato sigiloso, devendo prevalecer o disposto no Código de Ética Profissional do Assistente Social e atentando para o conteúdo ético-político dos princípios que o regem, destaca Márcia.

“A análise do sigilo profissional a partir da ética mostra que se está diante de algo complexo, que não se limita a um preceito legal. Ou seja, o seu entendimento remete às questões: para quem?; com qual necessidade?; para quê? e em que condições? Essas questões não podem ser pensadas abstratamente, mas sim a partir das situações concretas nas quais estão inseridas, pois interrogam a multiplicidade de demandas que lhe são colocadas na comunicação de uma informação.”

De acordo com a assistente social do TJMG, o sigilo profissional não pode vir separado da reflexão ética, como se fosse uma simples questão técnica ou mesmo procedimental.

“As questões que despertam e os dilemas que apresentam ao cotidiano do exercício profissional impelem a necessidade de uma postura analítica da realidade, da clareza do objetivo profissional, que não se deixe burocratizar ou tecnificar, de ações norteadas por princípios éticos no lugar de preconceitos, e de uma competência que não reforce a subalternidade dos usuários do Serviço Social, ao contrário, construa possibilidades de reconhecimento de direitos”, pontua Márcia.

A quebra do sigilo profissional por imposição, traz consequências funestas ao profissional, configurando-se em infração grave prevista no Código de Ética profissional do assistente social. Portanto quem infringi-lo, diante de denúncia ao CRESS, poderá responder processo ético e sofrer as sanções previstas no Código, que vão desde advertência reservada até à cassação do registro profissional.

Suspensão judicial

Em 2013, a Resolução do CFESS 554/09, que versa sobre o não reconhecimento do Depoimento Sem Dano como atribuição ou competência do assistente social, foi suspensa por ordem judicial em todo o território nacional. Para Márcia, a decisão levou assistentes sociais do Tribunal de Justiça de Minas Gerais a se inteirarem mais e se posicionarem de forma crítica sobre o tema, visto que a instituição que a suspendeu é parte interessada na implantação do método.

“A categoria toma o seguinte posicionamento: se faz necessário sim, um meio para punir os abusadores. Contudo, não é a criança ou adolescente que deve fazer o papel do juiz, como propõe a metodologia. A justiça deve ser feita com responsabilidade e não a qualquer custo. Assim, é urgente e necessária uma mudança no fluxo dos encaminhamentos da rede, para o atendimento dessas vítimas quando ocorre uma denúncia”, avalia.

Interesse social

O debate sobre o DSD é importante não apenas no seio da categoria de assistentes sociais, como das demais profissões que lidam diariamente com vítimas de abuso sexual contra crianças e adolescentes, tais como médicos, enfermeiros, agentes de saúde, psicólogos, advogados, juízes, promotores, sociólogos, antropólogos, aponta Márcia.

“Trata-se de um tema que interessa a toda a sociedade, uma vez que o abuso sexual pode ser vivenciado em qualquer esfera social. Por isso, é preciso educar as pessoas para que elas saibam lidar com o assunto e aprendam a direcionar uma possível denúncia”, pontua.

Já os assistentes sociais, por atuarem com diversas demandas de violação de direitos, devem ter um olhar crítico frente à questão do DSD. Para Márcia, não se pode tratar essa metodologia como uma solução para a diminuição dos casos de abuso sexual, pois isso não vai acontecer. O fato de se julgar e sentenciar alguém que cometeu o abuso, não fará com que o índice de casos diminua.

“Assim, os profissionais de Serviço Social necessitam estar esclarecidos e promover debates mais amplos sobre esta questão. Também é preciso debater com o próprio Tribunal de Justiça que quer implantar essa metodologia à revelia, sem conhecimento prévio do trabalho que já é realizado por psicólogos e assistentes sociais nos processos que envolvem abuso”, completa Márcia.

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