Publicado em 20/11/2014
No Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, o CRESS-MG traz conteúdos para refletir sobre a importância desta data.
“Nós negros não criamos o racismo e não temos que desconstruí-lo sozinho", afirma a militante Larissa Borges.
A juventude negra brasileira é diversa, com várias características, especificidades e formas variadas de viver a condição juvenil. Enquanto sujeito político, esse é um segmento com muitas demandas, mas a principal, e que unifica os diversos jovens negros, é pelo direito de viver, através do enfrentamento e finalização do genocídio da juventude negra.
No Brasil, em 2012, das 56 mil pessoas assassinadas no país, 30 mil eram jovens entre 15 a 29 anos e, desse total, 77% são negros, como apontam dados do Mapa da Violência cruzados com informações do IBGE.
Os jovens negros das periferias de todo o país, do campo, das universidades, os/as jovens negros/as das religiões de matriz africana, das religiões neopentecostais, do movimento Hip Hop, do Samba, do Funk, das universidades, entre outros têm reivindicado:
“Parem com a matança de jovens negros!”
Saúde, educação, moradia, lazer, trabalho digno e outros direitos só fazem sentido se a pessoa esta viva, como pontua Larissa Borges, militante nos movimentos de mulheres negras e do Hip Hop e coordenadora da Articulação Nacional Juventude Viva.
“Pessoas mortas não exercem direitos. A vida é o primeiro e mais importante direito humano, e quando não garantido, inviabiliza o exercício de todos os outros. O Brasil é considerado o quarto país que mais mata adolescentes e jovens. A cada meia hora um jovem negro é assassinado! Vivemos uma situação epidêmica, morrem mais jovens assassinados no Brasil que soldados em contexto de guerra”, destaca.
Polícia assassina
"Sinceridade, abertura e o reconhecimento dos seus preconceitos é a forma com que o brasileiro deve lidar com as questões raciais", afirma o jornalista e militante Bruno Vieira.
Os métodos e práticas utilizados pela polícia brasileira são fortemente marcados pelo racismo institucional e, por isso, se materializam com a abordagem racialmente orientada a incapacidade do Estado em oferecer serviços de modo adequado e garantir direitos para os sujeitos e grupos independente da sua cultura, origem racial ou étnica.
“A polícia brasileira ainda opera a partir de pressupostos teóricos e metodológicos fundamentados em preconceitos e estigmas. As práticas das corporações e de muitos policiais em diversos níveis hierárquicos são fortemente influenciadas por estes estereótipos e o resultado disso é percebido nas abordagens policiais de jovens negros, os conhecidos ‘baculejos’, os autos de resistência e o crescente encarceramento em massa de jovens negros”, aponta Larissa.
Tal incapacidade institucional se potencializa conforme a idade, sexo, orientação sexual, identidade de gênero e local de moradia dos sujeitos abordados. Números das pesquisas e casos como a chacina em Belém (PA), no dia 4 de novembro, onde pelo menos nove pessoas foram mortas supostamente por PMs, como vingança pela morte de um membro da corporação, na mesma noite, evidenciam que a vida da população negra é considerada menos importante que a vida de pessoas não negras.
“A comoção gerada pela morte de uma pessoa branca geralmente é bem maior que a comoção pela morte de vários jovens negros. É como se os jovens negros fossem menos humanos. Assim, importa evidenciar que o processo de criminalização e desumanização que banaliza e naturaliza estas mortes é o racismo”, complementa Larissa.
Há uma criminalização de ser preto, pobre e favelado no Brasil. Diferentemente de Gilberto Freyre que diz que vivemos numa "democracia racial" – e Sérgio Buarque de Hollanda, que afirma que o brasileiro é um "homem cordial", nosso país é fortemente segregado e dividido por uma questão racial que a todos afeta, mas ninguém quer visibilizar ou colocar em xeque, como exalta Bruno Vieira, jornalista e integrante do coletivo Conexão Periférica, que coordena um programa de rádio sobre periferias urbanas e movimentos sociais na rádio UFMG Educativa 104,5 FM.
“A questão da violência, digo, truculência policial tem muito a ver com o fato de as periferias serem majoritariamente negras, de serem territórios de exclusão social, com deficiências de políticas públicas que impeçam a juventude de se enveredar pelo tráfico. Sem falar na guerra às drogas que mais se assemelha a uma guerra às pessoas e que em nada demonstra funcionalidade – haja vista o pequeno traficante ser mais passível de punição que um político dono de helicóptero cheio de pó”, afirma.
Eu me importo
A pergunta “77% dos jovens assassinados no Brasil são negros. Você se importa?” foi feita pelo quadrinista, Laerte Coutinho, em sua página do Facebook e aponta para a necessidade de responsabilização de toda a população brasileira frente ao genocídio dos jovens negros.
Assim como esse tema, todos aqueles relacionados com a questão racial e o enfrentamento as desigualdades geradas pelo racismo não são “questão do negro”. São questões sociais com as quais negros e brancos devem se implicar, como destaca a jovem militante, Larissa.
“Nós negros não criamos o racismo e não temos que desconstruí-lo sozinho. Quem fez esta merda é que tem que desfazer – no caso, os brancos. Porém, como tal questão muito nos afeta, estamos implicados na desconstrução do racismo incansavelmente desde o período colonial.”
Com sinceridade, abertura e o reconhecimento dos seus preconceitos. Essa é a forma com que Bruno acredita que a população brasileira deve lidar com as questões raciais.
“Essa coisa de dizer ‘não tenho preconceito, mas…’ só ajuda a, cada vez mais, deixar as coisas veladas, ocultas, intocáveis como tabus. Transformar esses tabus em totens – como fazem os Antropófagos da Semana de Arte Moderna – é o ‘marco zero’ para o início de um reconhecimento social acerca da população negra e das suas necessidades de especificidades – tal como as populações indígena, LGBT, transexual, cigana, em situação de rua etc”, destaca.
Paralelo à mudança de paradigma sócio-cultural, as ações afirmativas são um dos caminhos para minimizar a situação de desigualdades na sociedade brasileira. Para Larissa, essas ações, incluindo cotas e política de permanência nos espaços de poder como as universidades e cargos públicos, são fundamentais neste processo e devem ser valorizadas, visibilizadas, fortalecidas e ampliadas.
“Além das cotas, é fundamental a implementação da Lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino da história e cultura do povo negro africano e brasileiro nas escolas. Para isso, já temos muitas referências positivas e materiais didáticos e pedagógicos, entre eles o Kit ‘A COR da Cultura’, disponível na internet”, complementa.
Leia também: Para o negro, a ditadura ainda não acabou.
Protagonismo da juventude negra
Desde a década de 1970, o movimento negro vem pautando o enfrentamento ao genocídio da população negra. A própria criação do Movimento Negro Unificado (MNU), em 1978, que marca a história dos processos de organização e luta das negras e negros brasileiros, na atualidade, tem como marco a prisão, tortura e morte do jovem Robson Silveira da Luz, durante a ditadura militar.
Atualmente o Fórum das Juventudes tem a bandeira do enfrentamento à violência contra as juventudes. Neste ano, o Fórum lançou a Plataforma Política Juventudes contra Violência, um conjunto de ações e propostas com vistas ao enfrentamento da violência – enquanto violação de direitos.
A plataforma elenca 10 eixos programáticos que visam subsidiar e abarcar essa discussão. Um dos eixos é "Enfrentamento ao Genocídio da Juventude Negra" e pode ser conferido aqui.
Outro importante grupo de movimento negro juvenil é o Fórum Nacional de Juventude Negra (Fonajune) que junto com os demais movimentos negros tem concentrado esforços para a aprovação do PL 4471/2012, que acaba com os autos de resistência.
Em nível nacional, há a campanha "Reaja ou será morto, reaja ou será morta!", que visa essencialmente discutir a questão do extermínio da população negra, das formas de se combater esse genocídio. Além das campanhas “Mano não morra, não mate!”, “Campanha do laço laranja”, “Juventude Marcada para Viver”, “Porque o senhor atirou em mim?”, “Campanha Jovem Negro Vivo” que expressam a relevância que o genocídio dos jovens negros alcançou na agenda política do país e a urgência de discutir o tema.
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