Matéria especial – Estatuto da Família representa retrocesso ao excluir famílias com casais do mesmo sexo

Publicado em 09/07/2014

Na última semana foi comemorado o Dia Internacional do Orgulho Gay e Lésbico (28/06) e para lembrar a data, o CRESS-MG põe em debate o conceito restrito de família proposto pelo Estatuto da Família. Confira a matéria!

Há cinco anos, a escritora e tradutora Ana Luiza Libânio (foto) vive com a sua companheira e a filha de 14 anos, fruto do seu primeiro casamento. A adolescente vê com naturalidade a relação homoafetiva da mãe, pois, cresceu num ambiente em que o amor é o que define uma família, não a orientação sexual dos membros, comenta Ana Luiza. “Nunca impus nada, porque acredito no aprendizado de construção. Aos sete anos, ela me perguntou se eu era gay, eu disse que sim, e seguimos nossa vida. Quando resolvi viver com outra mulher, a questão da sexualidade nunca foi um problema”, conta.

A união estável e o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo já são permitidos no Brasil desde 2011. As determinações foram dadas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, respectivamente. Pelas dificuldades de executar as normas, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça divulgou uma resolução obrigando os cartórios a cumpri-las.

Na contramão desse avanço, foi criado, recentemente, um Projeto de Lei (PL) intitulado Estatuto da Família, que traz diretrizes de políticas públicas voltadas para a valorização da entidade familiar. Entretanto, o PL, de autoria do deputado federal Anderson Ferreira (PR-PE), define como família o núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, excluindo as famílias compostas por casais do mesmo sexo, como é o caso de Ana Luiza.

Retrocesso

O Estatuto da Família vai contra o que vem sendo discutido sobre o conceito de família, não só no Brasil, mas em outros países, como afirma o assistente social e coordenador-adjunto da Comissão Ampliada de Ética e Direitos Humanos do Conselho Regional de Serviço Social de Minas Gerais (CRESS-MG), Gustavo Teixeira. “Na sociedade contemporânea, há diversas formas de ser família, não apenas o padrão heteronormativo. Há aquelas constituídas por casais homoafetivos e as monoparentais, compostas apenas pelo pai ou mãe solteiros, e que igualmente precisam de proteção do Estado”, aponta.

Restringir o conceito de família vai além da questão LGBT. “Esse entendimento não pode se basear em valores morais ou religiosos e deve dar conta da multiplicidade de ser família na sociedade atual”, afirma Gustavo.

Em fevereiro, o site da Câmara dos Deputados lançou uma enquete que indaga os internautas se concordam ou não com o padrão de família determinado pelo PL. A pergunta teve mais de um milhão de votos e foi a mais acessada da página. O resultado parcial aponta que mais de 60% são a favor do conceito.

Mas os números da pesquisa virtual não refletem o que a sociedade pensa, como avalia o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno. “Hoje dificilmente um cidadão não conhece um casal homossexual. Isso é uma realidade que deve ser considerada pelos deputados. Este PL não coincide com o pensamento da sociedade, e vai contra a realidade normativa, visto que a união entre gays e a adoção de crianças por esses casais já são permitidas”, aponta.

Outro destaque de Carlos Magno é para o fato de o Estatuto não ter sido fruto de uma reivindicação social. “O Congresso Nacional, aqui no Brasil, se baseia muito em suas convicções religiosas e morais e se esquece de atender as reais demandas da população. Isso é prejudicial para a democracia”, ressalta.

É proibido amar

“Não posso andar de mãos dadas na rua com a pessoa que amo, por medo da reação das outros”, conta a escritora Ana Luiza. Do lado oposto ao conservadorismo da sociedade, estão indivíduos e famílias que, por fugirem do padrão heteronormativo, ou seja, casais heterossexuais, sofrem discriminação cotidianamente.

Ana Luiza diz que sua relação é bem aceita por amigos e familiares, mas, admite que vive se policiando para evitar a discriminação. “Nós, seres humanos, temos o péssimo hábito de criar conceitos e não nos permitir ver além daquilo. Por conta disso, às vezes, eu, e tantos outros homossexuais, precisamos omitir quem somos”, pondera.

Frequentadora de um grupo cristão de meditação e simpática ao budismo, Ana Luiza diz não seguir nenhuma religião específica e acredita que o fundamentalismo religioso é o principal fator por trás do preconceito. “Não podemos basear nossas ações em textos escritos num contexto diferente do atual. Se você quer acreditar em um Deus que seleciona as pessoas pela orientação sexual, problema é seu. Prefiro acreditar em um Deus que ama sem preconceito.”

Sobre a enquete da Câmara, a escritora diz que, a seu ver, a família é constituída por pessoas que se gostam e que se importam umas com as outras. “O conceito de família é muito mais emocional e sensível do que estabelecer o sexo das pessoas que a integram. Não entendo porque tanta gente acha prejudicial, famílias como a minha, se eu não faço nada além de criar uma pessoa com muito amor. Onde está meu erro?”, indaga.

A pergunta sobre o Estatuto da Família continua no site da Câmara (www.camara.gov.br). Ela será encerrada após a votação do projeto ou, automaticamente, depois de 15 dias sem que os internautas a acessem.

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