O politicamente correto, as fake news e o Serviço Social

Publicado em 20/06/2020

O termo “politicamente correto” diz respeito ao combate a posturas excludentes e discriminatórias. Entretanto, setores conservadores da sociedade usam a expressão para desqualificar mudanças comportamentais e societárias, chamando aqueles setores que buscam tais mudanças de “geração mimimi”, ou seja, das pessoas que se queixam de forma excessiva do status quo.

O Serviço Social, enquanto profissão que defende em seu projeto ético e político uma nova ordem societária, incluindo a luta pelo fim do racismo, do machismo e da LGBTfobia, pode ser visto como parte desse movimento. Mas, afinal, o que faz com que uma parcela da sociedade veja as mudanças em direção à igualdade como algo negativo?

Quanto à categoria, é possível defender este projeto na atuação profissional ao passo que na vida pessoal, os preconceitos continuam sendo reproduzidos? Para falar sobre isso, o CRESS-MG conversou com o assistente social e professor do Curso de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Maurílio Castro de Matos. Confira!

 

1. Qual relação podemos fazer do projeto ético e político do Serviço Social com essa ideia do “politicamente correto”?

No Brasil, as diferenças foram escamoteadas historicamente, visando fortalecer uma construção ideológica de harmonia, na qual, por exemplo, por muito tempo se falou de uma relação pacífica entre as diferentes classes sociais. Nesse contexto, buscou-se acreditar que não havia preconceitos por aqui. Mas as discriminações eram e ainda são visíveis e se expressam de diferentes formas. 

Somos conhecidas e conhecidos por sermos um povo alegre, que ri de si mesmo, o que é muito importante para a nossa saúde mental e que conforma nosso modo de ser diante da dureza das condições de vida e de trabalho no Hemisfério Sul do mundo, neste país marcado por uma grande desigualdade social. 

Contudo, é pela face do humor que muitas gerações foram sociabilizadas achando natural o xingamento a mulheres, pessoas pretas, gordas, nordestinas, gays etc. Ainda existem piadas para todos os gostos, que criticam diferentes segmentos, exceto para o padrão heteronormativo, ou seja, homem, branco, jovem e heterossexual. Como diz uma música da banda carioca Barão Vermelho: “rir de tudo é desespero”. 

No cinismo da harmonia interclasse e interracial brasileira, esse tipo de humor foi, e ainda é, a válvula de escape para legitimar o preconceito. Colocar limite nesse tipo de humor, ridicularizando o “politicamente correto” é uma forma estratégica de negação dos preconceitos, mesmo que supostamente ingênuos, mesmo que supostamente apenas para fazer rir. Afinal, não é todo riso que é saudável e solidário.

Isso tem toda ligação com o Projeto Ético e Político do Serviço Social, que se pauta na recusa a todas as expressões do preconceito e na defesa dos direitos humanos, por exemplo. O público-alvo das piadas daqueles que querem continuar agindo de forma “impoliticamente” correta, atinge uma população que em grande parte é usuária das instituições onde trabalham assistentes sociais.

E é ingênuo pensar que afeta “apenas” moralmente (o que, por si só, não é pouco, a exemplo do que informa o debate sobre bullying nas escolas) as vítimas, mas afeta também de forma concreta, vide as violências, por exemplo, que as mulheres ou as populações negra e LGBT sofrem.

2. Considerando que o conservadorismo também tem crescido dentro da categoria de assistentes sociais, qual a importância da internalização do projeto ético e político para além do exercício profissional?

O conservadorismo integra o modus operandi do capitalismo, logo, esse modo de interpretar a realidade nunca se ausentou. Considerando que o Serviço Social atua na realidade, com as expressões da questão social, o conservadorismo não evaporou dentro da profissão. O que ocorreu é que a profissão construiu, há mais de 40 anos, no Movimento de Reconceituação, um projeto de profissão alternativo e de combate a essas ideias e valores ultrapassados.

Tal projeto se desenvolveu e hoje tem diferentes expressões (no marco jurídico-normativo, na produção do conhecimento, nas experiências profissionais etc.) e possui acúmulo para o enfrentamento das expressões conservadoras. O aumento desse retrocesso na categoria, se deve a uma recuperação de propostas conservadoras e que podem ter repercussão no trabalho profissional.

Algumas vezes, por desconhecimento ou porque não realizamos a devida crítica a essa vertente do Serviço Social, profissionais acabam caindo num canto da sereia que de novo, não tem nada. É a reedição de um passado anacrônico. Por isso, uma formação profissional continuada e crítica, junto com um agir ético emancipador (ambos pautados no projeto ético e político) são fundamentais.

3. Um dos recursos de ampliação desse pensamento conservador/neoliberal tem sido a criação e disseminação de notícias falsas, muitas vezes, legitimadas pelo próprio Governo Federal. Quais as implicações das “fake news” na garantia de direitos da classe trabalhadora? 

No Governo Bolsonaro emerge um novo projeto conservador, mais cruel e perigoso, trata-se de um projeto com expressões neofascistas. O neofascismo não apenas ignora a diferença, mas visa eliminar o diferente. A relação do atual governo com a mídia é muito parecida com a do fascismo da Europa, ocorrido há cerca de 100 anos atrás, de perseguição à imprensa e negação do conhecimento.

O governo brasileiro quer se comunicar com a população diretamente não apenas através da criação de veículos estatais, mas passando informações indevidas, não confirmadas e também mentirosas, que são as fake news, ou notícias falsas, em português. A população está sujeita a se informar, na maioria das vezes, pela mídia burguesa ou por estas fake news. E isso tem sido perigoso, inclusive para a saúde do povo, em tempo de pandemia. 

Assistentes sociais são profissionais que têm como instrumento a linguagem e podem ter um papel importante na socialização das informações, lembrando que toda intervenção profissional de assistentes sociais têm uma dimensão educativa. Estas e estes profissionais devem atuar de acordo com as normativas da profissão. 

Assim, é imprescindível o compromisso ético, por exemplo no caso da pandemia da Covid-19, de socializar informações corretas que as autoridades da saúde pública, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) vêm divulgando.

 

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